Não lançar um produto ou serviço no momento certo pode ser fatal para um negócio. Analisamos empresas que souberam usar o timing a seu favor e outras que se perderam no tempo

Em conferência do TED, o empreendedor americano Bill T. Gross, conhecido por ter fundado diversas startups, disse que entre os cinco elementos-chave para uma empresa ter sucesso está, em primeiro lugar, não perder o timing de suas iniciativas – ou seja, lançar um produto ou serviço antes da concorrência ou quando o mercado demandar. (Abaixo, mostramos os pontos fundamentais).

Timing

O conselho de Gross joga luz sobre companhias que não perderam o timing e hoje despontam no mercado, caso da Airbnb e Uber. Elas têm destaque porque lançaram algo disruptivo, mas, sobretudo, no momento certo.

Durante a palestra, ele diz que a Airbnb não foi levada a sério no início por investidores, pois muitos não achavam viável que as pessoas disponibilizassem espaço em suas casas para estranhos.

“Os usuários provaram o contrário. Um dos motivos de seu sucesso, além da boa ideia, foi a execução no momento certo”, disse Gross. “Ela surgiu em um período de recessão, quando as pessoas precisaram de renda extra, e, assim, alugaram espaços para turistas. O mesmo aconteceu com a Uber, que gerou renda para motoristas autônomos que estavam desempregados.”

Criada em 2008, a empresa de aluguel de imóveis por temporada conquistou o título de unicórnio (quando a empresa vale mais de US$ 1 bilhão) quatro anos depois. Hoje, seu valor de mercado chega a US$ 31 bilhões. Já o aplicativo de transporte está avaliado em US$ 46,4 bilhões.

O ecossistema das fintechs

No Brasil, vemos o mesmo fenômeno disruptivo com as fintechs, que atuam para oferecer serviços financeiros mais baratos e sem taxas abusivas em relação às instituições tradicionais. E mais: tudo mais fácil e na palma da mão.

O ecossistema já chega a 550 delas e cresce a cada ano. A pioneira a impulsionar este movimento foi a Nubank, fundada pelo colombiano David Vélez. O banco digital, famoso pelos cartões roxo, nasceu para desburocratizar serviços financeiros e hoje já está presente na vida de mais de 15 milhões de pessoas. Seu valor de mercado atingiu US$ 10 bilhões em 2019, tornando-se a primeira fintech brasileira a alcançar esta marca.

O sucesso da operação está em suas soluções, que foram ao encontro das “dores” dos brasileiros desbancarizados – o número de pessoas que não tem conta em banco já chega a 45 milhões, de acordo com o Instituto Locomotiva. Além disso, a Nubank coloca sempre o cliente no foco de suas iniciativas, o que é fundamental hoje no mercado.

Além dela, outras fintechs não perderam tempo e seguem o mesmo rastro de sucesso: a Stone e a PagSeguro, com suas maquininhas de cartão e serviços para micro e pequenos empreendedores; e as diversas plataformas que têm levado a vida financeira dos brasileiros para a tela do smartphone.

Uma delas é o PicPay, que através de um único aplicativo possibilita que os usuários recebam e enviem dinheiro, paguem boletos, contas em restaurantes, entre outros serviços. A comodidade já chamou a atenção de 12 milhões de pessoas, das quais cinco milhões são clientes recorrentes. O objetivo da plataforma é chegar a 20 milhões de usuários em 2020.

“Nosso propósito é democratizar o acesso ao sistema financeiro e dar ao usuário a escolha de se bancarizar ou não, já que isso não é mais uma necessidade. Tendo um celular com câmera, qualquer pessoa pode baixar e usar o app, sem burocracia”, diz Diogo Robert, head de parcerias do PicPay. “O futuro do sistema financeiro está nas fintechs”, acrescenta.

Já no setor varejista, elas souberam aproveitar o timing

A empresa Magazine Luiza é um dos cases brasileiros mais emblemáticos tratando-se de digitalização. Desde 2015, a companhia comandada por Frederico Trajano intensificou as estratégias para atrair os consumidores para o cenário digital, apostou na multicanalidade e colocou o cliente no centro de toda sua transformação.

Naquele período, quando ainda estava nos primeiros passos de sua transformação digital, o preço de sua ação chegou a custar R$ 0,16; agora, em dezembro de 2019, saltou para R$ 44,37. À época, o mercado avaliava a varejista em R$ 200 milhões – hoje, quatro anos depois, ela vale R$ 72 bilhões. O segredo da valorização foi não perder o timing da inovação.

Atualmente, 48% do faturamento da companhia vêm do ambiente digital. Mas ela quer mais: o objetivo da empresa em 2020 é digitalizar outros setores e entrar para a categoria de “super app”.

Já no mercado varejista americano, o destaque vai para a Best Buy. Desde 2010, o setor sofre com a crise e com o fechamento de milhares de lojas, o chamado “efeito Amazon”, que diz respeito à ascensão do comércio eletrônico. Naquele período, o consumidor da Best Buy ia à loja física para analisar o produto que queria comprar, mas fazia o pedido na Amazon, pois o preço era muito mais competitivo.

De olho no crescimento do e-commerce e, sobretudo, para garantir uma melhor experiência ao cliente por meio da multicanalidade, ela não ficou à mercê do destino, como a Sears e a Forever 21, que hoje sofrem com o declínio. Pelo contrário: foi à luta. Com uma visão mais estratégica, o CEO, Hubert Joly, reformulou a nova identidade da marca.

A transformação digital ocorreu por meio de duas estratégias: showrooming e omnicanalidade. A primeira refere-se às lojas físicas. As vitrines da Best Buy se transformaram em uma espécie de ponto de exposição para outras marcas, o que gerou renda extra à companhia e, de quebra, melhorou a experiência do consumidor na loja.

Enquanto a omnicanalidade veio através de atuação mais dinâmica, tanto na loja quanto em casa. Clientes da rede já compram online e recebem no mesmo dia. Além disso, a operação digital rendeu mais vendas na loja física.

“Atualmente, 70% dos consumidores que visitam as lojas Best Buy começaram o processo de compra online; 40% dos consumidores que compram online preferem retirar suas compras na loja, mesmo com frete grátis; e 15% das retiradas resultam em compras adicionais”, disse Stephen Gillett, presidente de digital e marketing da Best Buy.

Após investir em sua transformação, ela recuperou a confiança dos investidores. Em 2010, no início da crise, suas ações chegaram a US$ 45,52; em dezembro de 2012, caíram para US$ 11,29; em novembro de 2019, com sua transformação digital consolidada, US$ 75,05. Os dados são do Yahoo Finance.

Essas se perderam no tempo…

Colocado no mercado em 1979, o Walkman, da Sony, se tornou item obrigatório entre os adolescentes. Anos depois, em 1984, a companhia anunciou uma versão atualizada: o Discman, que tocava CDs.

Mas ele, assim como o Walkman, foi ficando cada vez menos interessante no final dos anos 1990, quando os MP3, MP4 e iPod surgiram. Menores, mais modernos e, sobretudo, digitalizados, eles permaneceram como os queridinhos até a popularização dos smartphones, que assumiram o papel dos aparelhos de música através de aplicativos como o Spotify.

“A Sony não se adaptou às inovações tecnológicas como digitalização, mudança para software e o crescimento de músicas para download online. Ela realmente tinha tecnologia para lançar um produto ainda melhor que o iPod, mas isso nunca aconteceu. A empresa estava com muito medo de testar algo novo, pensando que ameaçaria suas compatibilidades no mercado”, diz trecho de uma análise da Valuer.

Com a Kodak, a história é parecida. Ela, que em seu auge atingiu valor de mercado de US$ 31 bilhões, perdeu seu valor por não sair à frente. Em 1975, a companhia guardava a sete chaves uma invenção que, se tivesse sido lançada no momento certo, poderia ter dado outro rumo à empresa: a câmera digital. Com receio de atrapalhar seus atuais negócios, afundando as vendas de seus filmes fotográficos, ela própria se sabotou.

O ex-vice-presidente da Kodak, Don Strickland, disse: “Desenvolvemos a primeira câmera digital de consumo do mundo, mas não conseguimos aprovação para lançá-la ou vendê-la devido ao medo dos efeitos no mercado de filmes.”

Para Cláudio Carvajal, coordenador acadêmico da Fiap, esse é o momento para as companhias perderem o medo e agirem, afinal, o mundo caminha para o digital. “Nos próximos cinco anos haverá um salto muito grande no número de companhias brasileiras que vão repensar seus modelos de negócio e que investirão em transformação digital”, prevê. Perder o timing, definitivamente, pode deixar a sua empresa fora do mercado de vez. Sua companhia está perdendo tempo ou correndo contra o tempo?