O setor de transporte de cargas está mais tecnológico do que nunca: ferramentas digitais têm beneficiado a comunicação, a segurança e até facilitado a compra de peças. Tayguara Helou, presidente do SETCESP, revela a importância das novas soluções para quem trabalha nas estradas

Da sede do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região, o SETCESP, é possível ver, do alto, a Rodovia Presidente Dutra, principal via de acesso entre São Paulo e Rio de Janeiro.

Os milhares de caminhões que passam ali diariamente compartilham mais do que cargas. Eles carregam tecnologia – e ela está presente em diferentes níveis.

“A esmagadora maioria das empresas de transporte usa soluções tecnológicas, sejam elas básicas ou mais sofisticadas. Hoje, é impossível não ter, pelo menos, um item que monitore o veículo ou conecte o motorista à empresa”, afirma Tayguara Helou, presidente do SETCESP.

Um dos motivos que tem acelerado a era digital no setor é o excesso de ofertas no transporte de cargas. “No Brasil, sofremos um problema com a quantidade exacerbada de ofertas, causada por imprudência do Governo Federal, que criou sistemas de financiamento de caminhões. Isso gerou uma demanda artificial para o País”, diz.

A grande quantidade de caminhões nas estradas causou um desajuste na economia, que, segundo Tayguara, pode ser amenizado com a ajuda da tecnologia. “Quando temos excesso de qualquer coisa, temos uma disputa por preço baixo, causando assim um desequilíbrio. Tratando-se de transportes é ainda pior, pois é uma operação cara”, afirma. “Felizmente, as inúmeras soluções que chegam no setor visam a melhoria nas operações”.

Tecnologia nas transportadoras

Do lado das empresas de transporte, insumos, infraestrutura, mão de obra, o próprio caminhão e a tecnologia são itens básicos que encarecem a operação.

“A rede de fornecimento do setor é fechada: temos, no máximo, dois fornecedores de combustível no País; tecnologia também não é barata; a mão de obra, que é pesada na planilha de custos de uma transportadora, é definida pelas convenções coletivas, onde os patrões e os trabalhadores negociam. O empresário tem pouco a ver nessa negociação”, comenta.

“Essa rede de fornecimento consegue, pelo menos, repassar a inflação. Do outro lado, muitas empresas não conseguem, pelo contrário, acabam trabalhando abaixo do seu custo. O que causa esse desequilíbrio todo”, explica.

Tayguara Helou, presidente do SETCESP. Foto: divulgação.

Transformação digital

Os últimos cinco anos foram fundamentais para que Helou pudesse sentir a importância da tecnologia no resultado das operações. E ela tem feito, sim, a diferença. “O volume de tecnologia que chega é muito grande em todos os aspectos: insumos, na área operacional, aproveitamento de frota, customização de rotas, entre outros. E isso é excelente”, diz. “Não é precipitado dizer que a transformação digital já tomou o setor”.

Na busca por escala, novos conceitos tecnológicos, como Big Data, Inteligência Artificial e Blockchain também já estão inseridos na rotina do setor. “Muitas coisas estão acontecendo na área de tecnologia das empresas. E isso é apenas o começo”, comemora.

Mais segurança no transporte de carga

O roubo de carga no País tem sido um dos principais problemas enfrentados pelo setor. A questão é tão séria que chamou atenção em um estudo internacional.

De acordo com uma pesquisa feita pelo Joint Cargo Committee, comitê de transporte de carga do Reino Unido, o Brasil ocupa a sexta colocação entre os países onde o transporte de carga é mais arriscado. Ao todo, 57 nações fazem parte da lista. Perdemos, apenas, para regiões que estão em guerra, como Síria, Líbia, Iêmen, Afeganistão e Sudão do Sul.

“É, de fato, assustador. Já não é apenas um problema do setor, já é da comunidade, da sociedade brasileira porque se tornou uma das principais fontes de receita das facções criminosas que se utilizam desses recursos para se armarem e voltarem para a sociedade novamente”, diz Helou.

“É um problema do fabricante porque quando essa carga é subtraída, alguém depois compra. Você tem o receptador de carga, que tem que ser fortemente combatido, pois essa mercadoria é vendida por um valor muito menor, ou seja, cria uma concorrência desleal para a própria indústria”.

Com os roubos em alta, as transportadoras já estão abastecidas de uma arma superpoderosa, que vem sendo aplicada na capacitação de funcionários e na rastreabilidade dos veículos.

“Hoje, graças à tecnologia, temos dados de satélite, atuadores de sensores embarcados nos veículos, sensor de abertura de porta, de janela, de para-brisa, além de trava da quinta roda, bloqueador da porta do baú e outros sensores distribuídos pelos veículos”, diz. “A implementação de telemetria tem sido muito utilizada para contribuir com todas essas informações”.

Ou seja, além de o transportador saber onde está, exatamente, o veículo, tem a possibilidade de saber qual é sua interação no momento. “Ele pode estar em uma sala, remotamente, e travar o motor ou uma porta, ter noção da velocidade ou como está sendo a frenagem. A tecnologia já nos permite isso”, diz Helou.

Negociação de frete em um clique

Além de beneficiar a segurança dos motoristas e das cargas, a tecnologia também tem possibilitado a negociação de frete, através de plataformas específicas ou do velho e conhecido aplicativo de mensagens instantâneas, WhatsApp. Sim, ultimamente, é através dele que o motorista consegue garantir fretes, saber como estão as estradas e até evitar acidentes.

O caminhoneiro Manuel Valinha, de Belford Roxo (RJ), está cada vez mais conectado. “O WhatsApp é indispensável na nossa rotina. Usamos muito para receber e mandar notas fiscais e documentos. Também utilizamos outras plataformas para negociação de frete”, afirma ele, que participa de grupos no aplicativo de mensagens a fim de obter mais informações de trânsito e até negócios.

“Estou em vários, só para caminhoneiros, onde passamos e repassamos frete, avisamos onde o diesel está com melhor preço e até os locais de acidente e assalto. Uma forma rápida e eficaz de evitar problemas”, acrescenta.

Há 40 anos nas estradas, Valinha diz que a era digital tem contribuído muito com seu trabalho. “Antigamente, tínhamos que ir pessoalmente atrás de frete e enfrentar filas nas empresas de transporte. Hoje, com os aplicativos de mensagens e as redes sociais, não existe mais essa necessidade. Tudo é resolvido em poucos cliques”.

Manuel Valinha. Foto: Adriano Stofaleti.

O meio ambiente e o trânsito também estão na lista de melhorias. Sabe aquele veículo que está rodando com metade de sua capacidade? Com a tecnologia, isso está prestes a acabar de vez. “Já existem plataformas para aproveitamento de ociosidade dos caminhões, o que é maravilhoso, pois, dessa maneira, haverá menos poluição e maior fluidez no trânsito. É melhor para a sociedade”, complementa Helou.

Motoristas mais conectados

Os smartphones já são ferramentas de trabalho de caminhoneiros e motoristas. Muitas empresas, inclusive, têm disponibilizado aparelhos aos seus funcionários.

“Hoje existe uma gama de smartphones com várias funcionalidades e acessíveis para todos. As empresas, normalmente, dotam seus motoristas com um aparato tecnológico maior, já que, praticamente todos, têm de se comunicar com a transportadora através de aplicativos”, afirma Helou. “Já os autônomos usam para seus próprios negócios”.

Peças na rede

E quando o caminhão quebra ou precisa trocar uma peça na estrada? Manuel Valinha não perde tempo e consulta a internet pelo celular. “É sempre bom termos acesso à rede, pois assim sabemos onde está um varejo ou uma oficina quando estamos longe de casa”, afirma.

Mesmo longe é possível comprar peças e recebê-las, às vezes, no mesmo dia, onde estiver. O caminhoneiro Emerson Brzezinski, de Erechim (RS), adquire itens pela rede sempre que precisa.

Até desmontar e levar uma peça a uma loja física, perco dois dias. Prefiro comprar online, já que, muitas vezes, recebo no mesmo dia via motoqueiro. Além disso, economizo dinheiro, pois consigo comparar preço”, diz. “Hoje, a internet move tudo, sem ela não conseguimos fazer nada, paramos no tempo”, afirma Emerson Brzezinski.

O setor de transporte de cargas tem 188 mil empresas, cuja frota alcança 1,3 milhão de veículos. Já os 919 mil transportadores autônomos atingiu 1,1 milhão de veículos. As 400 cooperativas são donas de uma frota de 18,8 mil veículos.

Com uma frota em que a idade média é 18 anos, quanto mais peças disponíveis, melhor. “Quanto mais velhos, mais reparações e mais planos de renovação de frota fazem sentido no Brasil”, diz Tayguara Helou. “Sou favorável a todas as soluções que trazem produtividade ao setor”.

O Canal da Peça, marketplace que reúne mais de 500 varejistas de todas as regiões do País, que, juntos, somam mais de 700 mil peças para veículos automotores (carros, motos, caminhões e motos), é uma dessas soluções.

Na nossa plataforma, o usuário pode escolher entre o melhor preço e o prazo mais rápido de entrega. A variação do valor de uma mesma peça, dependendo da região, pode chegar a até 80%, e para algumas localidades, o frete pode sair gratuito.

“Eu sou aficionado por tecnologia porque, há muito tempo, eu já havia percebido que é através dela que a gente consegue buscar uma solução e melhorar os processos das empresas como um todo. É ótimo saber que existe uma ferramenta onde você tem facilidade em adquirir suprimentos”, afirma Helou.

No caminho da digitalização

Informações de peças e das indústrias também são bem acessadas pelos caminhoneiros, que aprovam aplicativos de fabricantes. “São ótimos, pois consigo consultar um item em um catálogo digital, com foto ilustrada e todos os dados. Não tem como errar na hora de comprar ou quando surge uma dúvida”, garante Emerson Brzezinski.

Quando o assunto é digitalização, apesar de o setor já estar no caminho, ainda carece de melhorias. Para Helou, a tecnologia, mais uma vez, é a única que pode suprir as deficiências.

“Defendemos muito as ferramentas digitais para melhorar a eficiência operacional, na utilização da frota etc. Acreditamos muito na tecnologia para a interação do público com o privado. Buscamos uma padronização e cadastramento único de veículos. Ainda falta o que fazer. O setor já está preparado para as mudanças, pois a tecnologia nunca para de evoluir”, diz. Sorte a nossa.